Regresso
ao "Orfeuzinho". Daqui a três horas vou ver a Patti Smith, uma lenda
viva, a poeta do punk-rock. Aqui no "Orfeuzinho" há uma placa de
homenagem ao Manuel António Pina, grande poeta e cronista. Parava aqui.
Conheci-o pessoalmente. Quanto a mim, permaneço entre os vivos. Vou levando a
minha avante, apesar do pouco dinheiro. Observo as pessoas. Na cidade sempre há
mais variedade. Sou da cidade. Do movimento, das ruas, até dos carros e das
sirenes das ambulâncias. Como Pessoa, como Mário de Sá-Carneiro escrevo à mesa do café. Já tenho um certo
nome. Já dizem: olha o poeta! Ainda não escrevi a obra-prima, apenas a espaços.
No entanto, agora posso-me sentir mais tranquilo, agora posso dedicar-me
inteiramente à obra. Nunca mais terei de procurar outro trabalho. Sou poeta,
escritor, diseur, cronista. Pronto. É essa a minha profissão, a minha missão.
Contudo, devo falar mais, penetrar mais nos media, dirigir-me às pessoas. Devo
perder a timidez. Tenho coisas a dizer ao mundo. Tenho de falar às mulheres
belas. Dizer-lhes que há outra vida, outro caminho. Não as patranhas do
economês e da austeridade. Não o salve-se quem puder e o capitalismo. Sim,
outro homem, outra mulher, são possíveis. Não mais escravos, não mais macacos.
Sim, temos o poder do nosso pensamento, das nossas ideias e do nosso coração.
Se quisermos nada fará a nossa cabeça nunca mais. Estou aqui porque acredito.
Estou aqui porque sou. Estou aqui porque sou o meu próprio deus. Não me calas,
ó Passos! Não me calas, ó Cavaco! Não me calais, ó polícias! Não passais de um
bando de imbecis. Só que nós que temos sido cegos, como avisou Shakespeare. Mas
agora perdemos a vergonha, mas agora perdemos o medo. Agora somos nós os
senhores..
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